Espiritualmente, o número cinco simboliza a união, o centro e o equilíbrio. Ironicamente (ou não), a banda 5 a Seco ou cinco anos longe dos palcos, em pausa, e está de volta agora, com um novo projeto, o quinto álbum do grupo. O novo disco, que ganhou o nome de Sentido e foi lançado nesta quinta-feira (28), simboliza também o quanto os cinco integrantes estão conectados e unidos.

Sentido traz o conjunto de canções mais plural da história do 5 a Seco. Esse repertório inclui desde temas compostos para peças de teatro, até baladas de amor. De canções existenciais complexas a delicadezas autobiográficas, como uma canção escrita para esperar a chegada de um bebê. 

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Foto: Lorena Dini/Divulgação.

O amadurecimento individual e o adensamento das vidas pessoais dos cinco integrantes estão à frente de tudo. E a volta do grupo só foi possível porque a pausa foi feita no tempo certo.

À Banda B, Antônio Brandileone comentou que, mesmo afastados dos palcos, nenhum dos cinco amigos ficou longe um do outro durante estes cinco anos de pausa.

“A parte que eu sentiria falta, eventualmente, com a pausa do 5 a Seco, seria a convivência com os meus amigos, mas a gente nunca parou, nunca cortou, até em alguns casos se intensificou. A gente continuou se frequentando muito e a vontade da pausa vem, em medidas diferentes para cada um de nós, mas foi um consenso. Precisávamos desse tempo por várias questões e a gente aproveitou a pausa de muitos jeitos, aproveitamos muito esse tempo sem a obrigação de estar junto como banda. Isso até trouxe muita qualidade para a nossa convivência também. Uma das coisas boas que a gente traz é o frescor do reencontro”

avaliou Antônio Brandileone.

Durante a pausa, cada um foi viver a própria vida investindo nas carreiras solo, que nunca deixaram de lado. Leo Bianchini foi inventar nova vida em Portugal; Pedro Altério e Pedro Viáfora seguiram com seus projetos solo – incluindo aí o duo Pedros, que une ambos; Tó Brandileone se tornou um produtor requisitado em diversos gêneros; e Vinicius Calderoni tem se dedicado cada vez mais ao teatro, dirigindo e escrevendo espetáculos. 

Apesar de toda essa busca profissional, também se enxergaram adultos e, ao pensar no novo disco, encontraram um caminho ainda mais especial para ressignificar também essa nova fase de cada um. 

“A gente não sentiu falta um dos outros, mas sentiu falta de ser time, de estar junto. Mesmo que a gente estivesse junto individualmente, mas essa coletividade, que é muito específica, que é essa reunião que o 5 a Seco tem é sempre um caráter especial quando acontece. Os cinco anos foram muito reveladores do quanto a gente gosta disso, do quanto isso nos alimenta e o quanto esse brilho no olho, que tem o carinho, a iração mútua, está presente e é a condição de existência do projeto”

comentou Vinicius Galderoni.

Na avaliação de Vinicius, essa insociabilidade entre o fato de trabalharem juntos e serem amigos de verdade é algo que transparece.

“É um pouco da força do que é contagioso e contagiante do que a gente faz. Acho que as pessoas, desde sempre, quando veem o 5 a Seco, têm o prazer de ver um grupo que gosta das músicas, da sonoridade, do que está sendo dito, mas também gosta de ver como a gente se gosta. Tem uma camada invisível, que é a argamassa do afeto, que é invisível, mas é perceptível”

explicou Vinicius.

Pedro Altério avalia ainda que aquilo que aparece da banda é o que o grupo de amigos mais se dedica.

“A gente se dedica muito para o som, mas muito para ter cuidado com esse lugar do encontro. É natural que fique perceptível para as pessoas, porque é a matriz do 5 a Seco mesmo. A gente tem muito cuidado com o som, com a música, mas a gente tem mais cuidado ainda com a nossa relação. A gente cuida muito da amizade mesmo”

disse Pedro Altério.
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Foto: Lorena Dini/Divulgação.

Sentido ao tempo

Embora o nome do disco seja Sentido, o tempo é algo que fica evidente em todo o trabalho desse novo projeto. Mas, como tudo que envolve o 5 a Seco, aconteceu de forma natural, pela conexão dos cinco amigos.

“Realmente essa noção de que a gente estava falando sobre o tempo veio depois. Durante o processo não era comum, não pensamos que essa seria a temática do disco. Aconteceu. A gente acabou só depois, com o texto do Marcus Preto, e vimos que era verdade. As letras das quais eu fiz todas têm a palavra Tempo. E tem a ver com a naturalidade da composição”

avaliou Pedro Viafora.

Segundo Pedro Altério, a banda é muito conectada com o que está acontecendo no momento. Não sentaram e planejaram o assunto, mas aconteceu.

“Viemos num tempo de pausa e o mundo, nesses últimos cinco anos, aconteceu muitas coisas significativas. Quando a gente olha para o conjunto da obra, mais uma vez de maneira subjetiva, as arestas do repertório foram se ajeitando e a identidade do negócio todo foi assim. O tempo se tornou importante durante o processo”

refletiu Pedro Altério.

Além de toda essa questão da conexão com o que vem acontecendo ultimamente, também há a coisa interna: o 5 a Seco está junto há 15 anos e todos os integrantes se viram amadurecendo juntos.

“Tem uma questão emocional, um grupo há 15 juntos. Quando começamos, tínhamos 20 e poucos, agora estamos perto dos 40 e alguns até com 40. Estamos envelhecendo juntos e em alguma medida esse disco ganha um tom contemplativo. Se a gente amadurece, o que a gente faz acompanha o que a gente é. São cinco amigos olhando o tempo, pensando sobre o seu tempo juntos, sobre o tempo e os vários sentidos da palavra tempo e os vários sentidos da palavra sentido”

concluiu Pedro Altério.
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Foto: Aveda/Divulgação.

5 a Seco e Chico Buarque 

O novo disco Sentido abre com a música “Comédia de Enganos”, que foi escrita originalmente para a trilha de “Museu Nacional [Todas as Vozes do Fogo]”, peça que Vinicius Calderoni escreveu e dirigiu em 2022 para o grupo carioca Barca dos Corações Partidos. 

A canção, que por si só já carrega uma energia única, ganhou um novo frescor quando o grupo entendeu que havia potencial de um convite de participação ali. Surgiu Chico Buarque.

“Muito do que a gente faz é porque o Chico fez o que fez. Inclusive a música que ele canta no disco não foi feita para o disco, não estaria no disco, mas ela se apresentou num show com um parceiro nosso. Ouvi a música e falei que ela tinha que ser cantada por todos nós, tinha que abrir o disco. O Vini não teria escrito essa canção se o Chico não existisse, nem nós teríamos feito boa parte das músicas”

contou Antonio Brandileone.

O convite de participação para Chico Buarque veio por e-mail, como detalhou Antonio.

“Por um lado parece que é uma coisa, um acontecimento gigantesco e fora do comum, mas é tão natural que se deu e aconteceu dessa maneira. A gente escreveu um e-mail para o Chico com a canção, com o convite para ele cantar a última estrofe da música, e ele topou. A energia que está contida nessa canção é muito fruto da energia que o Chico botou no mundo […]. Julgamos a ideia meio alucinante, mas quando o Chico aceitou, antes mesmo dele cantar, começamos a ouvir o Chico cantando em nossas cabeças, do tanto que fazia sentido ele cantar essa estrofe”

detalhou.

Música como mensagem

Em tempos onde, cada vez mais, buscar mensagem em música se tornou raro, ou para poucos, o 5 a Seco investe no caminho contrário. Mas remar contra a maré do que é feito atualmente não é uma briga com o mercado e sim acreditar no que faz.

“A gente escuta desde sempre, vem dessa escola, de canção popular brasileira, onde a letra é muito central. Amo música gringa, inclusive em línguas que eu nem entendo. Gosto de música pop norte americana desde antes de eu aprender a falar inglês, gostava do som. Sinto que a gente é uma raça em extinção, acho que a letra vai ficando cada vez mais de lado na música, na canção. Mas eu acho que isso é uma coisa que vem cada vez mais sendo deixada de lado, mas a gente vem deste lugar e nem faço nenhum ponto de hierarquia. A gente vem dessa escola do texto, que pra gente é muito fundamental. Tanto que os arranjos estão conectados com a canção. Isso é uma coisa central em nossas vidas, a letra é um troço gigante para a gente”

avaliou Antônio Brandileone. 

Junto disso, Antônio Brandileone também destaca que a diversidade musical é uma parte importante do 5 a Seco. E isso se reflete no resultado final dos projetos, como é perceptível em Sentido.

“Isso é parte do que é o 5 a Seco. A gente tem muita fé na diversidade das cinco visões, dos cinco gostos musicais. A gente converge em um monte de coisa, diverge em um monte de coisa e a gente ama a divergência também. Acho que um elemento fundamental para que até as divergências sejam anônimas é o fato de que a gente pode manter as nossas vidas solo ativas. Isso torna a convivência muito leve”

comentou Antônio Brandileone.

Já Pedro Altério vai um pouco além e reflete que, junto da questão musical como mensagem, o 5 a Seco é um fruto das individualidades. 

“Uma banda acaba sendo um tempero de cada um e a diversidade é uma coisa que a gente incentiva dentro do grupo. É um processo subjetivo que a gente vai enxergando nessa diversidade toda, uma unidade. Quanto mais as individualidades estiverem representadas, mais diverso o álbum vai ser e mais unidade vai ter”

disse Pedro Altério.

Vinicius Galderoni disse que o grupo não tem tanto medo da compreensão de ‘vai ficar assimétrico’, ‘vai ficar distante’, que pode surgir sobre o som da banda. O importante é a essência.

“A capa do disco é um exemplo visual disso, cada um está andando para uma direção, mas o centro de gravidade está preservado. Não tem esse medo de dizer ‘nossa, essa música está soando muito longe’, o mínimo de convergência vai ter para a coisa parecer coerente e fazer sentido. Não é à toa que esse disco se chama Sentido, porque tudo que está dentro faz muito sentido e para a gente é um atestado do quanto ele é significativo para a gente”

avaliou Vinicius Galderoni.

União, o centro e o equilíbrio

Se o número cinco representa a união, o centro e o equilíbrio, o novo projeto do 5 a Seco é a força que o grupo poderia ter para demonstrar isso ao público. Ainda que não o faça de forma “partidária” ou que tenham buscado isso como mensagem de Sentido.

“Acho que essa mensagem é difícil de achar, seria desonesto eu achar que em 15 canções, escritas por cabeças tão distintas a gente consiga encontrar uma mensagem. Mas tem uma tônica, que não é exatamente uma mensagem, mas uma resultante do fato de nos mantermos numa banda durante tanto tempo e termos voltado agora. Nos anos 90, a esmagadora maioria dos artistas no topo das paradas eram bandas. Nos anos 2000 isso encolheu  muito. Nos anos 2010 mais ainda e agora não temos bandas entre as mais tocadas. Isso é um reflexo da atomização da sociedade, a gente está se individualizando cada vez mais. A gente estar em grupo e se manter em grupo é um elogio ao gesto coletivo, então de alguma maneira, num mundo que está se separando, a gente se juntar, é uma grande mensagem”

avaliou Antonio Brandileone.

Em breve, o 5 a Seco deve anunciar uma nova turnê pelo Brasil. Quando perguntamos se Curitiba estará na lista, a resposta foi de que a notícia virá. “Curitiba é uma cidade que a gente adora e que está entre os nossos planos, então é o que podemos dizer para o momento”, concluiu Vinicius Galderoni.

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Foto: Lorena Dini/Divulgação.